É preciso ser infinito para ser só.

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Capacidade de estar só:

Uma das grandes conquistas internas do verdadeiro amadurecimento é a capacidade de estarmos sós. Ocorre que estar sozinho não significa sentirmos solidão e angústia, como muitas pessoas tendem a experimentar.

A capacidade de estar só pode ser uma experiência extremamente prazerosa quando vem acompanhada da possibilidade de podermos usufruir da nossa boa companhia e dos nossos tesouros internos que podem ser ideias, sonhos, lembranças e bons sentimentos. A meu ver, esta é uma das conquistas mais incríveis que um ser humano pode fazer na vida.

“Eu quero uma casa no campo onde eu possa ficar do tamanho da paz”:

Na música de Elis Regina “Casa no campo”, ela diz: “Eu quero uma casa no campo onde eu possa ficar do tamanho da paz. E tenha somente a certeza dos limites do corpo e nada mais”. Nesta música belíssima, a autora narra a experiência estética do encontro consigo mesma e com a imensidão da paz, experiência que Freud chamou de “sentimento oceânico”. O nome que ele usa é muito poético porque descreve exatamente a sensação de completude e de ligação com o infinito das águas (internas).

Winnicott, importante psicanalista inglês, salienta em um texto chamado “A capacidade de estar só” que esta conquista humana só é possível se pudermos vivenciar a experiência de estarmos sós na presença de alguém, algo que ocorre no início da vida.

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Neste texto ele descreve que, se pudemos, quando pequenos, contar com a presença atenta e não ansiosa de um cuidador (normalmente a mãe), que nos permitiu ficarmos sós com as nossas próprias fantasias, numa espécie de solidão acompanhada, isso vai construindo na criança uma bagagem psicológica que lhe permite sentir prazer estando em sua própria companhia.

Solidão criativa X solidão aterrorizante:

Nesse sentido, acho muito importante diferenciarmos dois tipos de experiência de solidão: uma em que o sujeito realmente não se sente só porque está de posse de sua própria companhia e outra, muito diferente desta, em que o sujeito, quando sozinho, passa a se sentir atacado e angustiado pelo seu próprio mundo interno.

Na música da Elis Regina, é trazido outro elemento importante na construção desta capacidade de estar só que é a possibilidade de nos conectarmos com algo maior, ou seja, de podermos manter um sentimento de coesão e integração com o universo.

(Re)ligião = (re)ligação

Penso que aqui está contida a verdadeira experiência de religiosidade e de uma vivência estética da existência humana, muito diferente da vivência religiosa associada a culpas e punições. Trata-se de um sentimento de (re) ligação com o Universo, com a natureza e, eu diria, com a nossa origem mais primitiva, algo que faz com que nos lembremos de que somos parte da natureza e, portanto, seres integrados a ela.

mulher (1)Para finalizar, gostaria de retomar o título deste artigo “É preciso ser infinito para ser só”. Pensei neste título porque acredito que ele contém exatamente a ideia central da nossa verdadeira capacidade para estarmos sós que é a possibilidade de nos conectarmos ou reconectarmos com a nossa condição ao mesmo tempo infinita e mortal.

Infelizmente na nossa cultura, associamos morte ao fim, à derrota completa do homem sobre a natureza e penso que isso se deve a uma condição arrogante que costumamos manter – a de que somos imortais, infinitos, onipotentes. Desta forma, acredito que muitos sujeitos associam solidão à impotência, morte e fracasso.

Portanto, esta pode ser uma boa experiência para você testar de agora em diante. Tente ficar só e em silêncio por algum tempo. Desligue seu computador, celular, facebook. Desconecte-se de fora e, em silêncio ou na companhia de uma boa música, veja o que encontra dentro de você. Esta poderá ser uma ótima oportunidade para você ser apresentado ao seu “infinito particular”.

Abraços

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