O que é a psicologia clínica e o que faz o psicólogo clínico?

images (3)Meu objetivo neste post é explicar da maneira mais simples e clara possível para o leigo o que faz um psicólogo clínico.

Primeiro ponto importante: você não deve confundir o psicólogo clínico com o psiquiatra. Em linhas gerais, o psicólogo conversa. É o que costumo chamar de “médico da alma”. Já o psiquiatra é um “médico do corpo” que utiliza medicações para tratar as desordens mentais. Saiba mais sobre as diferença entre psicólogo e psiquiatra.

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Lançamento do livro Eu, Clarice

livro ana laura moraes martinezÉ com imenso prazer que compartilho com os meus leitores o lançamento do meu primeiro romance Eu, Clarice, publicado no formato de ebook.

Na romance o leitor poderá acompanhar de perto como a pequena protagonista, acompanhada desde o nascimento até a morte, entrega-se com paixão frente à árdua tarefa que sua mãe lhe delegou: encontrar a luz da verdade.

Em uma narrativa biográfica que acompanha cada momento da vida de Clarice, o leitor pode conhecer, na intimidade dos pensamentos da protagonista, como ela vai costurando as tramas de sua história pessoal bastante trágica.

Nesta busca incessante, a pequena Clarice dá mostras do seu heroísmo na medida em que encontra possibilidade de transformar os escombros de sua realidade familiar trágica em algo com que ela possa sonhar. Nesse sentido, Clarice pode ser cada um de nós com seus dramas internos e suas tragédias pessoais.

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Felicidade roubada

maquina de escreverO mar brilhante chamava o menino com seus braços verde-esmeralda. Era manhã de um domingo quente e o menino via o mar pela primeira vez. Fora o avô, seu avô duro e bom, que lhe proporcionara o encontro tão aguardado. Fugidos como duas pequenas lesmas, lá foram eles, como ladrões em busca de um quinhão de prazer: o avô guiando o caminhão enorme e o menino com seus pequenos olhos transpassando o limite das ferragens, com uma fome que pretendia engolir tudo de uma vez.

Chegaram e mal o avô teve tempo de estacionar o grande elefante vermelho, o menino zarpara com o coração batendo frenético como tambor. Abrira a porta num relampejar de olhos e, desembestado, correu com suas perninhas finas e um pouco tortas, em direção ao grande deus. No caminho, foi jogando suas roupas sujas, furadas do trabalho duro e precoce, um pouco prejudicado, é verdade, pelas brincadeiras irresistíveis de pneu com o irmão mais novo. Jogou tudo o que era sujo e roto, ficando só de cueca, com seu corpo esquelético de felino em formação.

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O homem que prendia pássaros

maquina de escreverA cena era brutal: pássaros que nasceram livres, lindos e coloridos, debatendo-se violentamente contra as grades da prisão. Aqueles pequenos pingos de milagre no meio do dia debatiam-se com tanta força e intensidade que de suas asas brilhantes o sangue já começava a verter; feridas fundas iam se formando por suas batidas frenéticas. A violência havia se imposto e os seres miraculosos nada podiam fazer contra ela. Estavam presos, vítimas da brutalidade. Marina e Pedro avistaram a cena horripilante soltando um grito surdo de horror.

Marina, frágil demais para suportar tamanha dor, sentiu seus olhos inundarem. Queria segurar a inundação que deixava sua alma exposta, mas não podia. Era translúcida demais.

Pedro, mais vigoroso de alma, pôs-se imediatamente a matutar como usaria sua força de leão para salvar os pingos de vida. Marina teve medo por seu amado, pois pensou que ele teria que ser tão robusto e vigoroso quanto às grandes gotas de chuva que lavam a poeira do horizonte, tornando-o límpido e fresco.

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Rito selvagem

maquina de escreverEla caminhava em direção ao mar sem saber o que a movia. Alguém que a visse naquela tarde chuvosa, com seus cabelos ensebados teria pena.

Mas não era pena o que ela queria do mundo. O que ela queria era sentir horror e a única forma de chegar a isso era se tornar um ser medonho de unhas sujas e verdes.

O mar também a lembrava de seu próprio pai que morrera anos antes, um exímio nadador, mais peixe que humano.

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Os irmãos

maquina de escreverFlávio e Pedro eram irmãos gêmeos. Disputaram desde sempre o mesmo ventre, o mesmo espaço, o mesmo amor. Nascidos, a mãe chegava a confundi-los de tão iguais que eram, exceto pelo gênio. É que Flávio era mais parecido com a mãe, segundo seus próprios dizeres e por conta disso ela o amava mais que ao outro. Apesar de tal realidade evidente, isso nunca lhe chegou à consciência:

Imagina amar um filho mais que outro? Que pecado!

Já crescidos, ambos ingressaram na Universidade. E, como o destino não deixa por menos, o inevitável aconteceu. Flávio e Pedro apaixonaram-se pela mesma moça: a linda Dulcinéia.

Adivinha quem ela escolheu?

– O Flávio. Óbvio! Ou você acha que o destino brinca em serviço?

Pedro, enlouquecido de tanta dor, não aguentou este golpe. Ao saber da escolha de Dulcinéia, esbofeteou a cara do irmão, quebrou-lhe o nariz e desapareceu para sempre em sua dor insana. Nunca mais se soube dele.

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Os sons da vovó

maquina de escreverA avó era surda como uma múmia. Incomunicável com o mundo, habitava um universo próprio, todo seu. Tinha medo de sair dele. Pavor mesmo. Sons humanos soavam em seus ouvidos como gritos horripilantes. Virgínia, a neta, tinha paixão pela esquisitice da avó. Suas peles flácidas, seus olhos caídos, sua tez branquíssima fazia Virginia se lembrar de um fantasma ou de uma bruxa. O silêncio da morte se aproximando era completamente misterioso para ela.

Havia dias em que a mãe de Virgínia, por um motivo qualquer, pedia para que a menina tomasse conta da velha. Eram momentos de puro terror e fascinação. A avó, muito velha e branca, era colocada sentada imóvel em uma cadeira de balanço antiga bem em frente à janela que dava para um pequeno jardim lateral da casa. A miúda se sentava, dura, ao lado da avó, em uma pequena cadeira. Ambas permaneciam imóveis a tarde toda. Virginia punha-se a observar atentamente cada pequeno movimento da velha, enquanto pensava com os seus botões:

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Identidade

maquina de escreverQualquer esforço em direção ao telefone era impossível para mim. Havia uma premonição tenebrosa se formando: a de que quanto mais eu caminhasse para o abismo, mais desgarrada e infiel aos padrões eu me tornaria. Uma revolta crepuscular queimava em meu peito e eu dizia a mim mesma:

Não. Não quero mais esta selvageria mentirosa. Todos estão doentes, verdes e desmantelados. Por que só eu percebo isso?

Minha única vontade era enrolar-me em mim, como caracol enegrecido, cauda junto de cabeça, pele junto de pele, até formar uma só coisa, um só nada. Até sumir.

Brotava em mim, de forma desenfreada, um puro desejo de não ser mais. Nada de telefonemas, de metáforas, de meios sorrisos, de olhares que se desencontram das palavras. Meu ser clamava pela verdade. Sem ela, me recuso agora a viver. O telefone olhava para mim, com ar impaciente. Precisava ligar para o banco, resolver pendências. É que eu havia perdido minha identidade e não sabia onde ela havia ido parar. O problema – e nisso residia grande parte da minha vergonha – eu havia sido descoberta em minha ausência de identidade pela linda moça do banco que, cheirosa e malévola, atendia sorridente aos clientes do dia.  Descobri que estava completamente sem identidade justo diante daquela linda moça. Fiquei estarrecida, envergonhadíssima. Ela, babando de prazer por ver minha dor e culpa, disse triunfante, para todo mundo ouvir:

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A menina e o cão

maquina de escreverA menina era tristonha e acanhada. Sentia impropriedade no fato de existir. Seu andar era como de gato, esgueirando pelos cantos. Certo dia, seu pai Josiberto trouxe a salvação: um belo labrador cor de mel. Pura inspiração. Seus olhos vivazes eram como uma humilhação para a menina tísica. Mas como que por desordem do destino tornaram-se unha e carne. Melhores amigos mesmo. Obviamente o cão dava por certo o fato de sua existência pacificada, bem instalada em seu corpo sólido e pouco conhecedor de si. Já a menina, instável na arte de amar, caiu doente, literalmente, de amor pelo nobre cão. Passou semanas se recompondo em sua cama, com o cão-fiel ao seu lado. Pobre menina. Ninguém havia ensinado a ela os perigos do amor!

Seu pai Josiberto e sua mãe Marina eram pessoas dotadas de coração, mas simples nas aquisições do sentir. Para eles, preto era preto e branco era branco. Sem mais conversações. E a menina, raptada pelas gradações subterrâneas do sentir, tinha fome de coração. Neste ritmo sonhador de ser, passava horas a fio olhando para o Nada, ao que sua mãe perguntada, meio enfezada:

O que é que tanto olha aí, menina? Vem me ajudar com a louça.

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